domingo, 10 de outubro de 2010

O essencial é invisível aos olhos

Muita gente quando criança leu O pequeno príncipe, de Exupéry. No ano passado tive a oportunidade de lê-lo novamente, desta vez para o Thiago, meu filho caçula, pois para minha sorte, a escola fez essa solicitação. Essa segunda leitura foi não só mais produtiva como também mais emocionante. Puxa vida, como aquele livro nos ensina! Aparentemente é um livro infantil, mas olha, os recados ali dados servem muito mais pra nós adultos.

Pra quem não terá a oportunidade de lê-lo novamente, pelo menos por agora, se possível dê uma paradinha para ler devagarzinho e com o coração o trecho abaixo que, aliás, é o meu predileto.

Beijo com amor!

Carlinha

E foi então que apareceu a raposa.

__ Bom dia - disse a raposa.

__ Bom dia - respondeu educadamente o pequeno príncipe, que , olhando a sua volta, nada viu.

__ Eu estou aqui - disse a voz, debaixo da macieira...

__ Quem és tu? - perguntou o principezinho. __ Tu és bem bonita...

__ Sou uma raposa - disse a raposa.

__ Vem brincar comigo - propôs ele. __ Estou tão triste...

__ Eu não posso brincar contigo - disse a raposa. __ Não me cativaram ainda.

__ Ah! Desculpa - disse o principezinho.

Mas após refletir, acrescentou:

__ O que quer dizer "cativar"?

__ Tu não és daqui - disse a raposa. __ Que procuras?

__ Procuro homens - disse o pequeno príncipe. __ Que quer dizer "cativar"?

__ Os homens - disse a raposa - têm fuzis e caçam. É assustador! Criam galinhas também. É a única coisa que fazem de interessante. Tu procuras galinhas?

__ Não - disse o príncipe. __ Eu procuro amigos. __ Que quer dizer "cativar"?

__ É algo quase sempre esquecido - disse a raposa. __ Significa "criar laços"...

__ Criar laços?

__ Exatamente - disse a raposa. __ Tu não és nada para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E não tenho necessidade de ti. E tu também não tem necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. Eu serei para ti única no mundo...

__ Começo a compreender - disse o pequeno príncipe. __ Existe uma flor... eu creio que ela me cativou...

__ É possível - disse a raposa. __ Vê-se tanta coisa na Terra...

__ Oh! não foi na Terra - disse o principezinho.

A raposa pareceu intrigada:

__ Num outro planeta?

__ Sim.

__ Há caçadores nesse outro planeta?

__ Não.

__ Que bom! E galinhas?

__ Também não

__ Nada é perfeito - suspirou a raposa.

Mas a raposa retornou a seu raciocínio.

__ Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens também. E isso me incomoda um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. Os teus me chamarão para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim não vale nada. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos dourados. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo... A raposa calou-se e observou por muito tempo o príncipe:

__ Por favor... cativa-me! -disse ela.

__ Eu até gostaria -disse o principezinho -, mas não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.

__ A gente só conhece bem as coisas que cativou -disse a raposa. __ Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo já pronto nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!

__ O que é preciso fazer? -perguntou o pequeno príncipe.

__ É preciso ser paciente -respondeu a raposa. __ Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. E te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás um pouco mais perto...

No dia seguinte o príncipe voltou.

__ Teria sido melhor se voltasses à mesma hora -disse a raposa. __ Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz! Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar meu coração... É preciso que haja um ritual.

__ Que é um "ritual"? -perguntou o principezinho.

__ É uma coisa muito esquecida também -disse a raposa. __ É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, adoram um ritual. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira é então o dia maravilhoso! Vou passear até à vinha. Se os caçadores dançassem em qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu nunca teria férias!

Assim o pequeno príncipe cativou a raposa. Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:

__ Ah! Eu vou chorar.

__ A culpa é tua - disse o principezinho. __ Eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...

__ Quis - disse a raposa.

__ Mas tu vais chorar! -disse ele.

__ Vou - disse a raposa.

__ Então não terás ganho nada!

__ Terei, sim - disse a raposa __ por causa da cor do trigo.

Depois ela acrescentou:

__ Vai rever as rosas. Assim, compreenderá que a tua é a única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te presentearei com um segredo.

O pequeno príncipe foi rever as rosas:

__ Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativaste ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu a tornei minha amiga. Agora ela é única no mundo.

E as rosas ficaram desapontadas.

__ Sóis belas, mas vazias - continuou ele. __Não se pode morrer por vós. Um passante qualquer sem dúvida pensaria que a minha rosa se parece convosco. Ela sozinha é, porém, mas importante que todas vós, pois foi ela quem eu reguei. Foi ela quem pus sob a redoma. Foi ela quem abriguei com o pára-vento. Foi nela que eu matei as larvas (exceto duas ou três por causa das borboletas). Foi ela quem eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. Já que ela é a minha rosa.

E voltou, então, à raposa:

__ Adeus... -disse ele.

__ Adeus -disse a raposa. __ Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.

__ O essencial é invisível aos olhos - repetiu o principezinho, para não esquecer.

__ Foi o tempo que perdeste com tua rosa que a fez tão importante.

__ Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... -repetiu ele, para não esquecer.

__ Os homens esqueceram essa verdade -disse ainda a raposa. __ Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela tua rosa...

__ Eu sou responsável pela minha rosa... -repetiu o principezinho, para não esquecer.

Antoine de Saint-Exupéry

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Lugares de paz

Cheguei quase 1 hora antes do combinado, toquei o interfone, me identifiquei e remotamente abriram o portão. Entrei, passei pelos vasinhos de flores que ficam na entrada. A casa estava toda escura e o silêncio era tão prazeroso que fiquei alguns segundos ali o aproveitando. Com certeza eu era a primeira a chegar! Vi uma luz fraquinha na capela e fui caminhando devagarzinho até lá. Antes mesmo de chegar perto, por uma das janelas semi-abertas, avistei o Padre Osvaldo em frente ao sacrário, sozinho e em oração. Resolvi não prosseguir pra não atrapalhar. Nos 20 minutos seguintes fiquei caminhando no escuro e em silêncio por todo o Recanto de Caná até que o PO aparecesse e um tempo depois começasse a chegar o restante do pessoal pra missa de entrega.

Como seria bom se eu pudesse ter aquela sensação de paz intensa com mais frequência! Sabe quando a gente acorda de madrugada, a casa toda escura e silenciosa, para não fazer barulho vai descalço até a cozinha tomar um copo d´água, na volta dá uma paradinha no quarto dos filhos e os vê dormindo aquele soninho melhor do mundo? É ou não uma sensação de paz maravilhosa?

A vida tem sido um turbilhão de atividades, trânsito caótico na hora do almoço, corrida pra dar tempo de cumprir todas as atividades do dia. No final de semana de setembro em que eu trabalhei na cozinha do encontro pros familiares dos internos, ficou ainda mais claro como estou em um ritmo frenético. Cozinha de encontro é puxada, a gente trabalha em pé da hora que acorda até a hora de deitar e, apesar disso, no final do sábado, pra minha surpresa, eu nem estava tão cansada assim... Dormi muito pouco de sábado pra domingo: faltava meu travesseiro, sobrava pernilongo, faltava também o vidro em uma das janelas e o vento frio entrava sem cerimônia; mas acordamos felizes no dia seguinte antes das 06 horas, trabalhamos o dia todo e o cansaço só foi bater pra valer em mim no final do domingo, por volta das 21h, depois de chegar em casa, tomar meu banho e deitar na minha cama. Isso mostra como o dia a dia tem sido muito mais exaustivo que um final de semana inteiro trabalhando na cozinha do Caná. Por que trabalhar sentada em frente ao computador, com o esforço físico de apenas 4 dedos (É! Sou catilógrafa) me deixa mais cansada do que a cozinha do encontro? Certamente a quantidade de risos dados naqueles dois dias foi maior do que em 1 mês inteiro no trabalho. Além disso, a troca dos relacionamentos superficiais (e muitas vezes não sinceros) do ambiente profissional pelas amizades verdadeiras também faz um bem danado!

Está claro que a Fazenda tem se tornado outro lugar de paz pra mim, e é inevitável, vou lá com a intenção de ser útil, mas saio sempre no lucro! E de lá tenho construído dezenas de boas lembranças, assim como tenho do Recanto...

São sensações como as acima que quero cada vez mais e as tenho buscado, porque o que me parece é que muitas vezes, fora destes lugares ou do ambiente familiar, estou numa selva.

São momentos e lugares como os que citei, que nos deixam mais leves pra dar conta do mundo lá fora. Desejo que vocês estejam na busca dos seus também!

Beijo grande!

Carlinha